quarta-feira, 1 de maio de 2013

Retrospectivas - James Dean


'you can wake up now, the universe has ended'


Há quem nasça com demasiada força. Pessoas que tendem a passar as suas curtas vidas em constante disputa com os elementos que as rodeiam. Testam-se - a si, aos outros e ao mundo - constantemente, movimentando-se inquietas por entre picos de felicidade e profunda depressão, nunca conhecendo cinzentos, nunca baixando os braços. Não são pessoas rijas, teimosas, ambiciosas e bem sucedidas - pelo contrário. Esta estirpe de Homens é complexa, frágil, em constante luta com os seus demónios interiores, sem nunca perceber bem qual o seu papel no mundo - onde encaixam.

James Byron Dean nasceu fraco, demasiado ligado à sua mãe, demasiado afastado do seu pai. Encarou a vida como uma prova experimental. Balançando entre vocações, acabou por achar o seu caminho em Hollywood, que o abraçou cedo pela mão de Elia Kazan. Kazan conheceu Dean por sugestão de um amigo, e mais tarde viria a comentar o facto de não ter gostado do miúdo, da sua complexidade e fragilidade, mas achar que era perfeito para o papel. East of Eden foi o primeiro dos três filmes de James Dean, e aquele que lhe valeu a sua primeira nomeação para Óscar. Dos três papeis de Dean, East of Eden talvez seja aquele que mais se coaduna com a personalidade do actor, e aquele em que ele deu mais de si. Rebel Without a Cause é um filme mais fraco, e a personagem de Dean mais unidimensional. Giant, o seu último filme, foi a sua grande prova - e uma que Dean venceu com o talento e a força que só ele conseguia oferecer.

A verdade é que, após a sua morte, o mito sobrepôs-se ao homem - as pessoas agarraram-se ao ídolo, e James Byron Dean ficou perdido no esquecimento. A pessoa profunda, complexa, o intelectual que era ficou ofuscado pelo seu mote 'live fast, die young', pelo constante desafio da morte e pelos seus curtos e pouco profundos casos amorosos. Também, como em tantos outros casos, foi após a sua morte que centenas de biógrafos decidiram explorar a sua vida, acrescentar os seus pontos, especular as suas vendas. Apareceram boatos de violações, de homossexualidade  de depressão crónica e outras patologias que tal. A verdade, é que a vida de Dean foi demasiado curta para se conhecer o homem por trás da cortina. Na sua carta a Elia Kazan, Martin Scorcese refere que "talvez se aprenda mais com a obra, do que com o homem" - é assim que penso em James Dean. Interessam-me pouco as suas crises existenciais - ainda que encontre algum conforto num modelo masculino que dividia atenções entre corridas de carros e poesia romântica - e mais a sua curta, mas brilhante, carreira.

Há quem nasça com demasiada força, mas consiga usá-la para seu proveito. Há quem desafie o mundo nos seus próprios termos, e vença cada batalha. James Dean foi uma força da natureza, e a força que usou no cinema, gastou-a na luta contra o mundo. Neste caso, o último levou a melhor, mas Dean ficará para sempre recordado como o rapaz que sonhou com a vida eterna, e a viveu com o abandono romântico de um sonho que nunca conseguiu bem interpretar.

6 comentários:

  1. É tudo isso, mas é um ícone para mim e, sinceramente, um homem genuinamente interessante. (Para além de, fisicamente, dar 15 a zero aos Channing Tatums do actualmente).

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  2. Eu sou suspeito, sou dos poucos que acha que o Tatum é bom actor! (quanto ao resto, não me sei pronunciar lol)

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  3. Epá este texto é um espectáculo.

    É curioso que ouvi o mesmo ser dito em relação ao Marlon Brando, que parece ter tido exactamente o mesmo tipo de sensibilidade, mas que sobreviveu ao próprio sonho.

    Quando se vê o East of Eden ou o Há Lodo no Cais, por exemplo, sente-se que só alguém que se debateu com dilemas, cuja sensibilidade é vasta o suficiente para ser contraditória e até confusa, opressiva, pode interpretar aquilo daquela maneira.

    Pessoas demasiado complexas e especiais para evitaram ser o pior inimigo de si próprias. O Dean foi mais rápido a destruir-se. O Brando torno-se um asceta repelente, alguém que nitidamente deixou de gostar de si próprio.

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    1. Merci Master! Mas acho mais curiosa a tua análise ao Brando - "alguém que nitidamente deixou de gostar de si próprio" - e assim fico com vontade de escrever uma retrospectiva dele.

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  4. Grande texto. Não sei se o East of Eden será o melhor trabalho de um actor que já vi mas é certamente o meu preferido. Grande texto.
    Nuno Rechena

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