Realização: Alejandro González
Iñárritu
Argumento: Alejandro González
Iñárritu
Elenco: Michael Keaton, Zach Galifianakis,
Edward Norton, Andrea Riseborough, Amy Ryan, Emma Stone, Naomi Watts
Como já não fazemos um
testa-a-testa há muito tempo e eu e o B. não tivemos a mesma opinião sobre a
nova e badalada película de Iñárritu, eis uma boa oportunidade para voltarmos
ao formato. (No
fundo até tivemos parecida… penso que ambos gostámos do filme, eu mais que tu,
e ambos entendemos que faltou um pouco de consistência na história e de
“arrepio”… densidade vá…)
Contudo, e para não tornar o
texto demasiado extenso e mastigado, optámos por destacar somente aquilo que
interpretamos como pontos-chave do filme, sejam positivos ou negativos.
Assim, os meus comentários
primeiro e dos B. em itálico:
- Birdman não tem uma mensagem concreta, não é um objecto definido,
por assim dizer. Uma das características que mais irrita em determinados filmes
é tentarem ser várias coisas em simultâneo e acabarem por ser nenhuma, apenas
uma amálgama de situações e intenções, sem que saibamos aonde o realizador quer
chegar.
Sátira de costumes? Drama
existencial? Rábula sobre sociedade de consumo vs cultura “elitista”? Crítica
cínica mas surrealista sobre o showbiz?
Sinceramente não sei. É uma mistura pouco palpável.
O Duarte dizia noutro dia que era
uma espécie de Black Swan versão
solar, e entendo a comparação, mas o filme de Aronofsky tinha uma identidade
vincada. A deste não consegui descortinar.
(Acho que o filme até se foca de forma
clara em 2 temas. Um principal: a decadência da fase mais negra do
pós-estrelato. Um paralelo ou secundário: o showbiz e as suas variações…
Penso que não se perde em nenhum dos
assuntos…onde pode confundir é no nº de ferramentas que usa para falar sobre os
temas… Ou seja, para descrever a queda de uma estrela, vai ao fundo da questão
com as relações com a ex-mulher e com a filha, com o drama existencial que o
persegue diariamente entre a rotina do sucesso e o mais que provável insucesso,
etc., etc…
No 2º tema temos novamente muitas
ferramentas… o ator “metódico” vs o hollywoodesco, a crítica e a barbaridade
que por vezes representa, o sucesso instantâneo por causa de um vídeo na
internet descabido…
Ou seja, penso que os 2 temas são claros e
obviamente se cruzam (não podes falar da queda de uma estrela sem mencionar
todo o mundo do showbiz), mas acabam por usar tantas ferramentas, que por vezes
podem-se até confundir com mais e mais temáticas, quando no fundo nem são.
O Aronofsky é um Deus existencial e que em
todos os filmes dele retratou a obsessão… Daí ter falado dele no Whiplash… Aqui
faz menos sentido porque é uma sátira com cenas de teor cómico, mas o Iñárritu
correu o risco de sair da sua alcofa habitual e tomara muitos terem-se dado tão
bem como ele… perfeito nunca poderia ser…)
- Falta alma nas cenas essenciais do filme. Naquelas definidoras, como a destruição do quarto ou o atrofio no topo
do prédio com o alter-ego. Carece de carga dramática, daquela força telúrica
que faz com que recordemos essas mesmas cenas como as mais brilhantes do filme.
Não sei se o que quis fazer foi simplesmente isso, ser propositadamente
desalmado. Lá está, nunca tenho grandes certezas com as intenções de Iñárritu neste
trabalho e isso não é bom. Mas sei que me soube a pouco.
(Aqui concordamos em absoluto… A cena mais
poderosa do filme é quando ele acorda com a cara no lixo e começa a andar na
rua com o Birdman… cena essa onde acaba por descolar e sobrevoar a cidade… Essa
cena TINHA de ser chave, TINHA de arrepiar e passar-nos um poderoso momento de
cinema, daqueles que levantava de facto os nossos pêlos todos… Mas não o
conseguiu… nem aí nem nas tais cenas do quarto… e qual a culpa disto tudo? Até
é fácil de entender, uma espécie de auto-castração que menciono no parágrafo
seguinte.)
- Apesar de tecnicamente ter
momentos muito bons, com long take shots
preciosos e alguns diálogos excelentes (adoro os de Mike e Sam no terraço!), há
um constante pretensiosismo do mexicano com a câmara, sempre a saltitar e com close-ups sufocantes, num género de
“Olhem o que sei fazer, como sou incrível!”. Também não me agradou. Algum
histerismo de realizador.
(Fazer um filme assim, é de uma dificuldade
abrupta… só gajos como ele, estrondosos tecnicamente o conseguiriam… não posso
criticar em termos técnicos uma coisa soberba, é como achar ridículo um jogador
vir da defesa até à baliza contrária a fazer cuecas a TODOS os adversários e meter
golo… porque porra… é do caraças!!
Quanto aos close-ups sufocantes para mim
são perfeitos…mais até com a doentia conjugação de planos de sequência
longuíssimos… o filme é suposto ser totalmente claustrofóbico… desde os
corredores apertados, à tensão constante de estar tudo a partir e a quebrar a
qualquer momento… ao facto de 80% do filme ser em interior, não é suposto teres
tempo para respirar e este tipo de plano é para isso mesmo… para te deixar
desconfortável e quase quereres sair dali… penso que se alguém consegue fazer
isto apenas com técnica, não pode nunca ser criticado, é de mestre e de quem
sabe o que está a fazer… podes não gostar? Ok… mas não se pode criticar o realizador
por ter conseguido esse efeito.
Quanto aos planos de sequência… sim, são
mesmo difíceis de fazer… sim, são mesmo difíceis de coreografar e de sair tudo
bem à primeira, sim, são doentios para repetir… No entanto, aqui ele exagerou…
muito! A ideia tecnicamente pode ser genial, mas NUNCA pode meter em causa o filme ou a emoção/sensação que ele possa querer transmitir…e mete… Voltando ao
ponto anterior, é graças a esta obsessão que as tais cenas mencionadas não
arrepiam, não nos encostam à cadeira, não nos deixam demolidos… O jeito que
davam uns cortes valentes no plano na cena com o Birdman na rua… o jeito que
davam uns cortes valentes na cena em que ele parte o quarto todo… tenho a
certeza que o problema esteve aqui… porque a coreografia das cenas é boa, as
representações também, mas isto falha…e falha redondamente…aqui ele colocou a
técnica e a brincadeira dos planos acima do filme, e isso é um erro adolescente
de quem sai da universidade, ao qual um Iñárritu não se pode dar ao luxo…).
- Além disso a banda sonora tirou-me
do sério! A bateria de Antonio Sánchez é brutalmente manipuladora, como há
muito tempo não sentia num filme – mais do que a do recente Interstellar, tão criticada há uns meses
por essa mesma manipulação. Não discuto o virtuosismo do músico, que existe,
mas é de tal forma obsessiva que a dada altura estava a causar-me incómodo. Incómodo
real. Ainda para mais, e recuando ao ponto anterior, tendo em conta a falta de punch emocional que se sente necessário,
aquela banda sonora pareceu-me algo deslocada, antitética.
(Aqui repito o que disse acima nos planos
fechados… é perfeita. Esta banda sonora leva o tal desconforto claustrofóbico
que ele pretende criar, para um nível estratosférico. Penso que a equipa só
pode estar de Parabéns por o ter conseguido… os índices de aperto e de sufoco
são inimagináveis… achei todo este tema da claustrofobia incrível).
- Dito isto, não odiei o filme,
simplesmente saí da sala desiludido. Esperava algo brilhante – podia inclusive
tê-lo sido – e não passou dum filme engraçado e meio louco. No entanto há que
referir que o elenco está todo ele a grande nível (óptimos Keaton e Norton!) e
com uma excelente direcção de actores.
(Eu
esperava o filme do ano… e não foi… por aí também saí desiludido. Esperava
daqueles filmes que ia ficar realmente marcado, mas não fiquei… acabei por
sentir isso num Boyhood que esperava, ou num Whiplash que não esperava… Mas é
um dos grandes filmes do ano, mas sem a consistência que podia ter. Toda a
direção de atores é irrepreensível…)
- Ah, e não me desagradou nada ver
a Naomi Watts e a Andrea Riseborough numa espécie de “explosão conjunta de
carinho e afecto”! Bem Alejandro, bem.
(Só
estranho como é que um Mexicano não se estica mais em cenas dessas… Em terra de
Salma Hayek… não se esperava menos…)
Vá, já “esprememos umas quantas laranjas”, agora digam de vossa justiça!:)
Golpes Altos: O elenco e a
direcção de actores. Alguns diálogos. O tecnicismo da realização em
determinados momentos.
(Interpretações, sufoco
transmitido e qualidade técnica.)
Golpes Baixos: Acima de tudo a
falta de definição do objecto. É uma obra que a meu ver peca por não ser
concreta, que tenta ser muitas coisas em simultâneo e faz com que nos percamos.
Iñárritu engasgou-se na sua ambição desmedida.
(Planos de sequência a roubar dramatismo a cenas-chave. Falta de densidade.)
(Planos de sequência a roubar dramatismo a cenas-chave. Falta de densidade.)