terça-feira, 4 de junho de 2013

Retrospectivas - John Huston



O crítico observa-o à distância. Alto, forte, respeitável - a sua figura opulenta arrasta-se, passo a passo, como um velho leão cujas pernas teimam em fraquejar. O crítico aproxima-se, a medo. 'You've been out of the movie festivals for quite some time. Why did you enter the competition this time?'. O velho leão ergue as sobrancelhas - 'Because I want to win. Oh yes, most definitely'.

John Huston foi um dos poucos homens que viveu segundo aquilo em que acreditava, e cuja obra tinha tanto de si quanto ele pôde dar. Nasceu fraco, doente e filho de um divórcio difícil. As adversidades pareciam criar em Huston um desejo pelo aperfeiçoamento. Tornou-se o homem grego. Viajou, estudou, escreveu, fez ballet, vaudeville, correu a cavalo, foi pintor abstracto e campeão de boxe. Huston lutou contra as adversidades da vida, e tornou-se um mito de si próprio.

Os seus filmes foram, na sua maioria, adaptados de grandes romances literários. Clássicos de aventura, de amor, de loucura, reflectiam a personalidade inquieta de Huston, a sua paixão pela vida - não pelo que é, mas pela luta que dá. Quando vimos filmes como Moby Dick, The African Queen, The Treasure of the Sierra Madre e Under the Volcano, conhecemos a mente de um homem que nunca baixou os braços, nunca confiou na vida, no amor, na paz nem na harmonia. Conhecemos um homem que sabia que a natureza do mundo era selvagem, e que se queríamos algo dele, teríamos que tirá-lo à força.

John Huston foi talvez a pessoa mais próxima de Hemingway que alguma vez existiu. Fez da sua vida uma obra artística, mas falhou em todos os pontos onde um homem deve vencer. Foi casado cinco vezes - Hemingway casou-se sete - e deixou em todas as suas mulheres um sentimento de incompreensão, de falhanço. Deixou nos seus filmes o homem que fez de si, superou-se fisicamente para não ter que vencer no campo emocional. Refugiou-se na bebida, em Puerto Vallarta, no México, onde passou os seus últimos dias. Pelo menos nesse campo, Huston distingui-se de Hemingway. Ao contrário do escritor, o velho leão sobreviveu a si próprio e nunca puxou o gatilho - para se suicidar, teria que aceitar a derrota face à vida e, nisso, Huston foi sempre vitorioso.

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