Realização: Michelangelo Antonioni
Argumento: Michelangelo Antonioni
Elenco: Marcello Mastroianni, Jeanne Moreau e Monica Vitti
O dia serve de prelúdio. Giovanni e Lidia caminham em direcções opostas, numa cidade triste feita de ruas despidas e reflexos esbatidos. Antonioni filma este dia na cidade, como se esta fosse demasiado alta para o casal se encontrar e demasiado estreita para poderem respirar. Dá uma constante sensação de labirinto. Um labirinto de cimento que sufoca duas pessoas cujos melhores anos já passaram há muito.
Giovanni é um passivo, um resignado que evita olhar para Lidia, com medo que o olhar possa sugerir uma intimidade para ele perdida. Lidia é um enigma (pelo menos para mim, que sou homem). Está numa crise. Percebe a indiferença do marido e passa o filme todo a vaguear sozinha - à espera de encontrar algo. No principio, pareceu-me serem um casal em sítios diferentes da relação, mas depois percebi que não. São apenas duas pessoas diferentes no mesmo sítio - onde, nas palavras de Giovanni, já não têm ideias.. só memórias.
O dia acaba, e o casal decide ir a uma festa. É nesta festa que tudo se passa - o que interessa é a noite. E, quando a noite acaba, o filme acaba com ela. La Notte segue a tradição do cinema italiano dos anos 60/70. É um filme alegórico, mas realista. Vale pelos diálogos brilhantes, e pela abordagem seca que faz do amor e da vida. A grande diferença entre La Notte e o La Dolce Vita é que, enquanto este último fala de um homem, La Notte divide a sua atenção entre os dois elementos do casal, dando-nos oportunidade de aprender com os dois, de analisar a relação dos dois, espelhá-la na nossa própria experiência de vida, e retirar algum ensinamento.
O filme insere-se na 'Trilogia da Alienação' de Antonioni. É o segundo, precedido pelo L'Avventura e precedendo L'Eclisse. A crítica recebeu mal o filme, muito provavelmente porque o mundo ainda não estava preparado para ver este tipo de cinema. Actualmente, é uma lufada de ar fresco ver um filme com mais de 50 anos que nos parece mais contemporâneo que os do nosso tempo.
O filme não é bem-disposto, porque o tema em si é pesado e os personagens demasiado realistas. Mas segue a tradição italiana dos comic reliefs por meio dos diálogos subtis e inteligentes. E eu evito utilizar esta palavra para caracterizar filmes. "Inteligente" soa sempre a pretensioso. Mas na verdade não existe outra forma de o colocar. É um filme inteligentemente escrito, que nos leva a sentirmo-nos menos sozinhos no mundo. Afinal não estou assim tão desalinhado, non é vero Michelangelo?
Golpes Altos: As personagens, os diálogos, a realização - A REALIZAÇÃO!!! - a cinematografia, a edição, a banda sonora... oh well... ah e a cena final... que cena final!
Golpes Baixos: Errr...
Argumento: Michelangelo Antonioni
Elenco: Marcello Mastroianni, Jeanne Moreau e Monica Vitti
O dia serve de prelúdio. Giovanni e Lidia caminham em direcções opostas, numa cidade triste feita de ruas despidas e reflexos esbatidos. Antonioni filma este dia na cidade, como se esta fosse demasiado alta para o casal se encontrar e demasiado estreita para poderem respirar. Dá uma constante sensação de labirinto. Um labirinto de cimento que sufoca duas pessoas cujos melhores anos já passaram há muito.
Giovanni é um passivo, um resignado que evita olhar para Lidia, com medo que o olhar possa sugerir uma intimidade para ele perdida. Lidia é um enigma (pelo menos para mim, que sou homem). Está numa crise. Percebe a indiferença do marido e passa o filme todo a vaguear sozinha - à espera de encontrar algo. No principio, pareceu-me serem um casal em sítios diferentes da relação, mas depois percebi que não. São apenas duas pessoas diferentes no mesmo sítio - onde, nas palavras de Giovanni, já não têm ideias.. só memórias.
O dia acaba, e o casal decide ir a uma festa. É nesta festa que tudo se passa - o que interessa é a noite. E, quando a noite acaba, o filme acaba com ela. La Notte segue a tradição do cinema italiano dos anos 60/70. É um filme alegórico, mas realista. Vale pelos diálogos brilhantes, e pela abordagem seca que faz do amor e da vida. A grande diferença entre La Notte e o La Dolce Vita é que, enquanto este último fala de um homem, La Notte divide a sua atenção entre os dois elementos do casal, dando-nos oportunidade de aprender com os dois, de analisar a relação dos dois, espelhá-la na nossa própria experiência de vida, e retirar algum ensinamento.
O filme insere-se na 'Trilogia da Alienação' de Antonioni. É o segundo, precedido pelo L'Avventura e precedendo L'Eclisse. A crítica recebeu mal o filme, muito provavelmente porque o mundo ainda não estava preparado para ver este tipo de cinema. Actualmente, é uma lufada de ar fresco ver um filme com mais de 50 anos que nos parece mais contemporâneo que os do nosso tempo.
O filme não é bem-disposto, porque o tema em si é pesado e os personagens demasiado realistas. Mas segue a tradição italiana dos comic reliefs por meio dos diálogos subtis e inteligentes. E eu evito utilizar esta palavra para caracterizar filmes. "Inteligente" soa sempre a pretensioso. Mas na verdade não existe outra forma de o colocar. É um filme inteligentemente escrito, que nos leva a sentirmo-nos menos sozinhos no mundo. Afinal não estou assim tão desalinhado, non é vero Michelangelo?
Golpes Altos: As personagens, os diálogos, a realização - A REALIZAÇÃO!!! - a cinematografia, a edição, a banda sonora... oh well... ah e a cena final... que cena final!
Golpes Baixos: Errr...
Buddy,
ResponderEliminarGrande artigo. Que mais há a acrescentar?
Algumas pessoas poderem achar o filme pesado em termos de ritmo (lentinho, como eu gosto) e de substância - falo dos diálogos, que são de facto inteligentes e carregados de ambiguidades. Aliás todo o filme é ambíguo, ao mesmo tempo opaco e transparente. Transparente porque tudo se passa à nossa frente espaço de um dia e uma noite sem que a acção apresente dúvidas (não há elipses ou "mistérios" narrativos). Opaco porque as personagens são ricas de uma vida interior que se vai lentamente revelando e que nunca conhecemos totalmente, como acontece com todas as pessoas interessantes.
E no entanto o filme é tão fresco e moderno, tal como o descreveste.
Talvez porque seja libertador ver alguém tratar as coisas sem as simplificar, e apresentar-nos as relações com tudo o que têm de complexo e desgastante, sem sucumbir à tentação dos finais felizes ou ao drama dos amores impossíveis.
*"Algumas pessoas poderem " é, obviamente "algumas pessoas podem".
ResponderEliminarMais uma vez a culpa é do Jorge Jesus, desta vez indirectamente, na pessoa dos seus "impressionadores", que insistem em trocer-lhes os tempos verbales e a gramáticas!
Esse último parágrafo, pelo menos, devia estar presente no post. É precisamente isso: uma relação que não está simplificada. E como nada nos é simplificado na vida a não ser os filmes, às vezes sentimo-los demasiado distantes da nossa realidade. Mas este é diferente, por isso é que é bom.
ResponderEliminarUm abraço pó Jasus e pó Tio Bruno, o nosso novo amuleto contra os bracarenses e, eventualmente, contra os russos.