Realização: Steven Spielberg
Argumento: Tony Kushner
Elenco: Daniel Day-Lewis, Sally Field, Tommy Lee Jones, John Hawkes, James Spader e David Strathairn
Não foi fácil formar uma opinião relevante sobre Lincoln. Dei de caras com um dos melhores elencos de sempre, com um guião brilhantemente trabalhado e com uma realização sóbria mas nem por isso menos perfeita. O que o filme me disse - essa é outra história.
Não posso deixar de me mostrar mais cativado pelo filme do que pelo homem. Abraham Lincoln foi um autodidacta, um homem com uma bússola moral perfeitamente afinada e um sentido de justiça acima do que se pedia naqueles tempos. No entanto, Lincoln não foi o líder forte que eu imaginava, o gigante de cartola que impunha respeito e cujo carisma era seguido pelas massas. Lincoln não era esse tipo de líder. Era calmo, paciente, modesto e a voz tendia a fugir-lhe para o rabo. Não fosse pela altura e o semblante cadavérico, não sei que tipo de carisma se podia esperar de um homem destes. Mas a realidade é que o teve, e utilizou-o de uma forma ultra-racional para satisfazer a sua percepção de "bem maior".
A temática do filme é circunscrita a um determinado período histórico, de um determinado povo, num determinado contexto. Isto para dizer que é obviamente mais significativo para os EUA do que para nós - que na realidade não temos memória colectiva de escravatura, por ser um assunto há tanto deixado por terra. Por esta razão, a primeira hora de filme atingiu-me como um tanto aborrecida, e os monólogos de Lincoln referentes a uma realidade que não era a minha - o filme não estava a falar comigo, e isso adormeceu-me. Mas eis que entra a personagem de Tommy Lee Jones, Thadeus Stevens.
Stevens é, na minha opinião, a personagem mais interessante do filme (incluindo o próprio Lincoln) e aquela que mais nos prende pelo dilema que é obrigado a enfrentar, e o que resulta dele. O comic-relief vem-nos dos três Senate Whips - responsáveis pela angariação de votos democratas e republicanos - interpretados por James Spader, John Hawkes e Tim Blake Nelson. A personagem de Joseph Gordon-Levitt considero-a não só irrelevante, como despropositada, porque o filme não lhe dedica tempo suficiente para que faça sentido a sua suposta profundidade.
No fundo, não considero Lincoln um filme biográfico, mas antes um filme histórico, referente a uma situação muito concreta da história dos EUA - a abolição legal da escravatura. O interessante é a abordagem do filme no que toca à igualdade. Pessoalmente, abomino a ideia de igualdade. Considero-a não só errada como perigosa, e acho que o melhor preconceito que podemos ter é que todos os homens nascem desiguais. Dito isto, acho que todos devem ser iguais legalmente, e a todos devem ser oferecidas iguais oportunidades de vida. O que retirei deste filme é que, no direito assim como na matemática, "se duas coisas são iguais a outra coisa, então essas duas coisas são também iguais uma à outra". Mas no fundo, essa premissa foi apenas utilizado por Lincoln para conseguir algo muito concreto e prático - a abolição da escravatura - e não para publicitar uma reflexão teológica acerca da origem do homem.
E respeito o filme por isso. Por não pretender ser mais profundo do que é. É um filme histórico perfeito - Igual a tantos outros na forma, mas único pelo conteúdo.
Golpes Altos: Interpretações, argumento, guarda-roupa e cenografia.
Golpes Baixos: Discurso final fraco e péssima montagem final da vela a ser substituída pela figura de Lincoln. O que mais uma vez me prova que Spielberg é bom porque se rodeia de gajos bons - quem escreveu este argumento maravilhoso, por exemplo.
Que grande filme! É um dos que quero rever!
ResponderEliminarAinda bem que não fui a única a achar que o Levitt não andava ali a fazer nada, foi uma pequena ideia peregrina do Spielberg...
Concordo que as interpretações e o argumento são 2 grandes pontos fortes do filme! Ainda não vi o The Master, mas tenho um ódiozinho de estimação ao Phoenix, por isso se o Óscar de melhor actor não for para o Daniel Day-Lewis dá-me uma coisa má!
Na minha opinião, o Phoenix este ano merecia o Óscar (apesar da interpretação do Day-Lewis ser incrível). Quando vires o The Master depois diz o que achaste. Para mim é o segundo melhor filme do ano e as duas melhores interpretações.
ResponderEliminarEstou bem mais curiosa com o Amour, espero conseguir ver ainda esta semana sem falta! Para mim entre os melhores do ano estão o Argo, Lincoln e Perks of Being a Wallflower, mas ainda me faltam ver uns quantos! ;)
ResponderEliminarSpielberg é mesmo um génio da imagem e da realização. Já o vi 3 vezes!
ResponderEliminarAnónimo,
ResponderEliminarTendo acabado de chegar de uma estafante viagem, e sem disposição para elaborar o comentário que este artigo merece, vou-me limitar a expressar o meu júbilo por semelhante demonstração de inteligência e bom gosto.
Ainda só vi 2, mas amanhã vou ver a 3ª!
Eu acho que morro bem sem nunca mais ver o filme. O que não significa que não tenha gostado, mas certamente não será um filme a rever.
ResponderEliminarEu por acaso tenho a mania de rever em casa tudo o que vou ver ao cinema, a menos que o filme seja mesmo muito fraco... :P
ResponderEliminarMerci beaucoup, Master.
ResponderEliminarAcabei de ver isto e é giro reparar que depois dos republicanos defenderem a abolição da escravatura, 150 anos depois temos um democrata preto na presidência.
ResponderEliminarAlém disto:
- Excelente realização,
- o papel do Phoenix é o dobro do de um dos meus actores preferidos de sempre (Day-Lewis),
- é daqueles bons filmes de que não gostei muito... é bom? Claro que é! Mas não gostei muito...
- há 10 anos o Spielberg tinha gasto o triplo e o filme tinha mais 1h com batalhas e efeitos especiais.
- os filhos são evitáveis no filme.
- "por detrás de um grande homem há sempre uma grande mulher" -> este filme trouxe-nos a excepção à regra.
Odeio a personagem da Sally Field por acaso! Mas também não adorei o filme, acho que é regra na maioria das pessoas que conheço que viram o filme...
ResponderEliminarPhoenix dobro, concordo.